Sequência de Anemia-Policitemia em Gêmeos (TAPS)

TAPS (Twin-Anemia-Polycythemia Sequence) é uma forma crônica de transfusão sanguínea entre fetos gemelares de gestações monocoriônicas.

Dr Rafael Bruns

Autor:

leitura 7min

atualização

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De Wikkelkinderen - Gêmeos Enrolados

A Sequência de Anemia-Policitemia em Gêmeos, conhecida pelo acrônimo TAPS (Twin-Anemia-Polycythemia Sequence) é um tipo de transfusão sanguínea que pode acontecer entre gêmeos que dividem a mesma placenta.

Nas gestações gemelares quando dois fetos dividem uma mesma placenta algumas complicações peculiares podem acontecer. Dois problemas importantes são a Transfusão Feto-Feto e a Sequência de Anemia-Policitemia. Estes dois problemas ocorrem em função das anastomoses vasculares que existem na superfície da placenta.

Placenta Monocoriônica

Imagem de placenta monocoriônica com vasos corados. As anastomoses estão assinaladas e o sentido do fluxo também. AV -Artério-Venosa; AA – Artério-Arterial e VA – Veno-Arterial.

As anastomoses que costumam causar problemas são as anastomoses artério-venosas. Estas anastomoses são unidirecionais levando sangue do feto doador para o feto receptor. Caso as anastomoses sejam de grande calibre teremos um caso de transfusão feto-feto, se as anastomoses artério-venosas tiverem um pequeno calibre teremos uma sequência de anemia-policitemia.

Qual a diferença entre Transfusão Feto-Feto e Sequuência de Anemia-Policitemia?

A grande diferença está no calibre dos vasos. Os vamos mais calibrosos (geralmente centrais na placenta) provocam uma transfusão aguda de um volume grande de sangue. Nesta situação teremos uma Transfusão Feto-Feto.

Já no caso de vasos de pequeno calibre, geralmente localizados na periferia da placenta, teremos uma transfusão lenta, causando um problema crônico de Anemia em um feto e Policitemia no seu co-irmão.

Clinicamente a apresentação será bastante distinta. No caso da transfusão feto-feto teremos uma situação de oligoâmnio no feto doador e polidrâmnio no feto receptor. A diferença de líquido amniótico é a chave para o diagnóstico da transfusão aguda e volumosa de sangue.

Já nos casos de TAPS a transfusão é lenta, portanto um feto não fica hipervolêmico e nem o outro hipovolêmico. Há bastante tempo para a compensação de volume sanguíneo por a transfusão é bastante lenta. A única alteração que será perceptível nos casos de TAPS é uma alteração na velocidade de pico sistólica da artéria cerebral média. No feto doador veremos um aumento da velocidade enquanto que no feto receptor esta velocidade estará diminuída.

Ilustração Sequência de Anemia-Policitemia VERSUS Transfusão Feto-Fetal

Ilustração mostrando o diferente mecanismo da transfusão feto-fetal e da sequência de anemia-policitemia.

Como é feito o diagnóstico de TAPS?

A Sequência de Anemia-Policitemia em Gêmeos é um evento relativamente raro, ocorrendo espontaneamente em no máximo 5% das gestações monocoriônicas. Já nas pacientes que tiveram transfusão feto-feto e foram tratadas com laser podemos encontrar até 12% de TAPS.

O TAPS é mais frequente após o laser pois eventualmente pequenos vasos na periferia da placenta podem não ser identificados e permanecerem abertos após a ablação de outras anastomoses. O TAPS é mais frequente quando a placenta é anterior pois esta posição de placenta geralmente dificulta a abordagem da borda próxima a entrada do fetoscópio.

A ultrassonografia com Doppler é o método de eleição para o diagnóstico. Velocidades maiores que 1,5 múltiplos da mediana indicam anemia enquanto que velocidades inferiores a 1,0 múltiplos da mediana sugerem policitemia. O estadiamento para TAPS segue o proposto por Slaghekke em 2010:

EstágioAchados Ultrassonográficos
1PVS ACM do doador > 1,5 MdM e PVS ACM do receptor < 1,0 MdM, sem outros sinais de comprometimento fetal
2PVS ACM do doador > 1,7 MdM e PVS ACM do receptor < 0,8 MdM, sem outros sinais de comprometimento fetal
3Achados dos estágios anteriores com comprometimento cardíaco do doador, identificado por alterações no doppler umbilical com diástole zero ou reversa; pulsatilidade na veia umbilical; índice de pulsatilidade aumentado ou fluxo reverso no ducto venoso
4Doador hidrópico
5Óbito de um ou ambos os fetos, precedido pelo diagnóstico de TAPS

Recentemente o valor preditivo e a utilidade clínica do ponto de corte inferior para policitemia foram questionados pois alguns casos de gêmeos monocoriônicos com diagnóstico de policitemia ao nascimento frequentemente apresentavam valores de pico de velocidade sistólica a Artéria Cerebral Média maior que 1,0 MoM antes do parto. Desta forma, em 2019 foi proposto um novo estadiamento, baseado na diferença (delta) entre o pico de velocidade sistólica dos dois gemelares:

EstágioAchados Ultrassonográficos
1Delta do PVS ACM > 0,5 MdM, sem outros sinais de comprometimento fetal
2Delta do PVS ACM > 0,7 MdM, sem outros sinais de comprometimento fetal
3Achados dos estágios anteriores com comprometimento cardíaco do doador, identificado por alterações no doppler umbilical com diástole zero ou reversa; pulsatilidade na veia umbilical; índice de pulsatilidade aumentado ou fluxo reverso no ducto venoso
4Doador hidrópico
5Óbito de um ou ambos os fetos, precedido pelo diagnóstico de TAPS

Em nosso site temos uma calculadora que pode ajudar a determinar se existe indícios de TAPS com base no pico de velocidade sistólica da artéria cerebral média: Calculadora de Sequência Anemia Policitemia (TAPS).

Tratamento para a Sequência de Anemia-Policitemia

Existem diversas opções terapêuticas para o TAPS. Nos casos mais leves a conduta é expectante, monitorando de perto as alterações dopplerfluxométricas da artéria cerebral média.

A ablação a laser das anastomoses, assim como na transfusão feto-fetal, também pode ser uma opção. Um fetoscópio é introduzido na cavidade amniótica e aplica-se uma quantidade de laser sobre as anastomoses para fechá-las. Isto geralmente é realizado entre 16 e 28 semanas.

Transfusões intra-uterinas também são uma opção para o feto doador. No final da gravidez, esse método dá algum tempo extra para os bebês. O doador recebe uma transfusão de sangue no útero, mas isso também implica em riscos para o receptor. Por esse motivo, a transfusão intraperitoneal é preferida, pois pode permitir uma absorção mais lenta de hemácias na circulação fetal, evitando a perda rápida de sangue transfundido na circulação do gêmeo receptor 

Referências

  1. TAPS Support
  2. Slaghekke F, Kist WJ, Oepkes D, Pasman SA. Twin Anemia-Polycythemia Sequence: Diagnostic Criteria, Classification,Perinatal Management and Outcome. Fetal Diagnosis and Therpy. 2010
  3. Tollenaar LSA, Lopriore E, Middeldorp JM, Haak MC, Klumper FJ, Oepkes D, Slaghekke F. Improved prediction of twin anemia-polycythemia sequence by delta middle cerebral artery peak systolic velocity: new antenatal classification system. Ultrasound Obstet Gynecol. 2019 Jun;53(6):788-793.
Categorias: Lembretes, Médicos
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